29 de janeiro de 2024

Viajando pelo Alto Minho - "Argas" a Paz das Montanhas


Da autoria de Castro Guerreiro, este livro condensa ao longo das suas 155 páginas, notas sobre a Serra de Arga, expondo o autor os diversos aspetos antropológicos que desenham aquele território, desde tempos anteriores à nossa nacionalidade.

Entre o seu texto narrativo, surge-nos pela mão do autor, quadras e fotografias que ilustram o quotidiano da Serra de Arga, da sua paisagem, das suas festas e dos seus protagonistas. Um quotidiano tão elogiado, por ser puro e resiliente ao passar dos séculos e que ecoa até aos nossos dias.

Um dos ecos menos conhecido é precisamente a lenda de um outro herói daquele povo, que não S. João de Arga. Falamos ou fala-nos o autor, de Santo Aginha. Eis o que podemos escutar:

"Aginha era um salteador temido por toda a Serra, a tal ponto que tinha a cabeça a prémio.

Um dia assaltou um monge, mas este conversou com ele e conseguiu convertê-lo à fé cristã. Como penitência, Aginha teria de ajudar o próximo sempre que para tal houvesse motivo e tivesse ocasião.

A primeira pessoa a receber o seu auxílio, foi um homem cujo carro de mato se tinha atolado na lama de um caminho da Serra. Aginha perguntou-lhe qual dos bois era o mais fraco e foi ajudá-lo desse lado. Nessa ocasião o carreteiro reconheceu-o e como não sabia a sua conversão, pegou na sachola e deu-lhe uma pancada na cabeça, matando-o. Em seguida, lançou-o para o meio de um silvado e mato por forma a escondê-lo.

Passado algum tempo, as pessoas que viviam no lugar mais próximo viam das suas janelas uma luz subir e descer no local onde se situava o silvado. Alguns dos mais corajosos decidiram e foram ver de que se tratava e depararam com o cadáver do Aginha que, embora mostrasse que a morte ocorrera havia já algum tempo encontrava-se total e completamente incorrupto e exalava um cheiro suavíssimo.

O povo levou o corpo de Aginha e sepultou-o no altar mor da capela do lugar que tem hoje o nome do Santo, o qual atraiu e ainda atrai enorme quantidade de romeiros ao local".

"Azinha" (rapidamente) se fez de um ladrão, Santo!

14 de janeiro de 2023

"O Urso-pardo na Serra de Arga: elementos históricos da sua presença na paisagem"

A atual paisagem da Serra de Arga, é o resultado do impacto da atividade humana ao longo de vários séculos, muito centrada inicialmente na desflorestação e depois no desenvolvimento e expansão de atividades agro-pastoris. Por via dessa colonização ancestral, foram-se desenvolvendo atividades agrícolas, que permitiram às comunidades locais fixar-se e obter subsistência, num território particularmente agreste e isolado. De entre essas atividades, destaca-se a produção de mel, a qual ainda hoje subsiste. A prática apiária deve ter sido ao longo de séculos, alvo de um difícil processo de empreendimento, resistindo contra a presença de algumas espécies animais, predadoras naturais do mel e de entre as quais se destaca com especial relevo, o Urso-pardo (Ursus arctos). A resistência a esta predação foi traduzida para a paisagem da Serra de Arga, com a edificação de muros-apiários, os quais teriam como objetivo principal a proteção das colmeias. Estruturas singulares da arquitetura vernacular e da etnotecnologia local, possuem suma importância para o estudo e referenciação deste território do noroeste ibérico, como espaço da presença do Urso-pardo, ocorrida no passado.

"Testemunhos da relação entre o lobo e as comunidades rurais da Serra de Arga"

A Serra de Arga situa-se na região mais litoral da atual área de ocorrência do lobo (Canis lupus) em Portugal. Neste território de montanha a relação das comunidades rurais com este carnívoro é caracterizada pela animosidade resultante da predação sobre o gado doméstico. O presente trabalho descreve os resultados obtidos em estudos de inventário de elementos etnográficos sobre a relação desta espécie com as populações locais da Serra de Arga, através de entrevistas e prospeção de campo. Verifica-se que esta região do Minho possui um rico acervo de práticas e crenças relacionados com o lobo, expressos em vestígios de arquitetura popular e nas memórias e tradições orais conservadas pelos seus habitantes mais idosos, que se inscrevem no universo da relação antropológica com o lobo, comum às áreas montanhosas do noroeste ibérico. É de destacar um assinalável conjunto de fojos do lobo num espaço geográfico tão reduzido, os quais, apesar de se encontrarem deficientemente documentados, testemunham o conflito entre o lobo e as populações ao longo de séculos. A valorização turística destes elementos culturais é importante para o conhecimento, conservação e sustentabilidade do património da Serra de Arga, ao qual o lobo confere um relevante cariz identitário.

17 de agosto de 2022

"Ditos, Contos, Lendas e... Serra d'Arga"

Esta obra de pouco mais de cinco dezenas de páginas, contudo grande pelo seu contributo na preservação do cancioneiro popular português, remete-nos para um tempo onde a fábula, a lenda ou o conto preencheu a animação dos serões das famílias em Serra de Arga, confinadas pela força do inverno, em torno de uma lareira à noite.
Textos que poderiam encontrar-se num dos clássicos de Alexandre Herculano ou de José Leite de Vasconcelos, mas que o autor da sua recolha (Artur Coutinho), quis manter como pertença do povo arguense, neste caso das populações que os contaram: Dem, Arga de S. João, Arga de Baixo e Arga de Cima, entre 1972 e 1978.


 

14 de agosto de 2020

A Romaria de São João D'Arga

Surgido inicialmente como um trabalho académico, este título foi posteriormente publicado sobre a forma de livro, onde ficou resumida, sem comprometer o rigor e abrangência de teor antropológico, que a autora lhe soube competentemente à época emprestar.
Maria Teresa Santiago Garrido, apresenta neste breve obra, aquilo que caracteriza a tão popular Romaria de S. João d'Arga, desde a sua geografia, passando pela sua etimologia até ao folclore pleno de cor e musicalidade. Tudo o que importa saber à partida, sobre a festividade religiosa e pagã que é celebrada nesta frincha do Alto-Minho, está lá!
E o convite para a viver aqui fica, nas palavras do seu cancioneiro tradicional:
Eu hei-de ir à Romaria
Ao Senhor S. João d'Arga
A Romaria é boa
O caminho é que amarga

Ó meu Senhor S. João,
Dá-me a mão pela janela
Que eu venho cansadinha
De subir a vossa Serra.

14 de janeiro de 2018

S. João d'Arga - 28 de Agosto (por Ruben A.)


Ruben A. no seu livro Páginas (V) remete-nos para o ambiente da festa de S. João d'Arga, quase no final da década de 60.
A descrição é pormenorizada, cheia de humor, num ritmo acelerado, como quem sobe a montanha, com pressa de lá chegar e carregada de um sentimento que transpira a Minho.
Quem já percorreu as encostas reconhece de olhos fechados cada metro do percurso e do ambiente descritos. Quem ainda não concretizou esta peregrinação à "Meca dos romeiros minhotos"... que se inspire na narrativa de Ruben A. para viver e admirar uma das noites em branco mais bem passadas de toda a nossa vida: "Pedra acarinhando pedra. Puxa mais para cima! Já levamos duas horas bem andadas de subida íngreme. Dá-me a impressão de que tenho o sangue todo nos pés. - À volta de nós a serra de rochas, pedras, pedras a dormitar, não chegam a sentir a comichão que lhe fazem estas formigas escarafunchosas. Passam mais ranchos - estes minhotos são como gatos de sete foles. Trabalham sempre, quase não dormem no Verão e borgueiam quando os santos fazem anos. Vão a dançar e a cantar como quem chupa caramelo. Eu, de língua de fora, pareço um perdigueiro depois de ter deixado as perdizes voar para outra fraga, lá nos fundos. Ainda se sobe mais, este caminho não é para funcionários públicos nem para comerciantes estabelecidos em casas de bancos ou de latoaria, menos para ministros - é um caminho de poetas, caminhos de pedras. Como esta gente é poeta! - Há uma alegria própria no cantar, aberta, convidativa ao amor, granito polido pelos versos." (...) "Chegámos ao alto, alto que fica encostado ao céu - céu e as narinas abriram-se entusiasmadas pelo bufar. Tudo virgem. Agora, daqui ao S. João, é uma boa meia hora a descer e lá daquele fundo já se vê a capela. Assim foi, passados cinco ou dez minutos, pela garganta do desfiladeiro, à direita, a meia altura, João de Arga estava em festa. As primeiras árvores da montanha -- oliveiras, carvalhos de uns quinhentos anos e uma grande muralha que faz pensar que a capela deve estar entremuros." (...) "O panorama tem majestade. O povo ali não se abana de artimanhas, é um sim de fé e de borga. Em S. João d'Arga não existem casas - há a capela, e à volta o quartel, nome pelo qual se chama a uma barraca onde dorme a malta bem empilhada. Mas ninguém dorme - não se pode dormir, a noite e as fogueiras altas de cada ninho de pedras raro possibilitam sono - dançam os ranchos, bebem como sequiosos do Nordeste brasileiro, tudo bebe mais vinho e tudo come pela noite fora. Ninguém para - vejo um embalar puro, sagrado, da gente que espera a primeira missa às cinco da manhã. Depois da comunhão tudo parte à debandada - formam-se novamente os ranchos e ao nascer do sol o formigueiro movimenta-se de partida. Dá-se lugar a outros que vêm passar o dia 29 junto ao santo. Não durmo, olho para aquele mundo como quem mira uma reserva humana em papel selado. É tosco, primitivo, frascário, mas é puro, é português."

A., Ruben "Páginas (V)", Assírio e Alvim, Lisboa, 2000, pp 87-96.

4 de novembro de 2013

Povo que lavas no rio


Reúne-se neste livro diversos apontamentos da autoria de Pedro Homem de Mello, sobre o quotidiano do povo que abnegadamente desejou existir para além do anonimato, moldado pelas suas crenças, tradições e medos.

Curiosas são as páginas em que Pedro Homem de Mello (d)escreve vivências da Serra de Arga: "Vozes de Arga" e "S. João d'Arga". Entre a tragédia e a folia, entre o religioso e a malícia jocosa, Homem de Mello, revela-nos argumentos que fazem da "montanha santa", um território onde nos podemos deixar transcender, enleados no mistério do contraste da paisagem ou do oculto que povoa cada uma das pequenas aldeias de Arga: "Quando a noite desce, negra e pesada, sobre a serra de Arga, é que a alma do seu povo sobe".

17 de setembro de 2007

Cancioneiro da Serra d'Arga, por Artur R. Coutinho (4ª edição, 2007)



Esta é a 4ª edição do livro, editado pela primeira vez em 1981, da autoria de Artur Rodrigues Coutinho.

Este novo exemplar, fac-smilado da 3ª edição, visa contribuir para o apoio das obras sociais da Paróquia de N.ª S.ª de Fátima (Viana do Castelo), nomeadamente a edificação da nova igreja e centro social.

Sem dúvida, excelentes e valorosos motivos para adquirir este livro, que se encontra à venda no cartório desta paróquia vianense ou em qualquer livraria regional. O preço é de €10. Para mais informações contactar o telefone 258 823029.

Eis algumas quadras soltas da obra, completo repositório da etnografia da Serra d'Arga:

A água daquela serra
Por copos de vidro desce;
Nem a água mata a sede
Nem o meu amor me esquece.

Abaixo da Serra d'Arga
Onde fica minha aldeia,
Na linda terra de Dem
Onde o meu amor passeia.

Abaixa-te Alto do Tapado,
Que eu quero ver Castanheira,
Quero ver o meu amor
Lá nos campos da Lapeira.


COUTINHO, Artur "Cancioneiro da Serra d'Arga", Viana do Castelo, 2007, 253pp.